Cultura
Feira chama atenção para importância da agricultura familiar

É clássico dizer que a agricultura familiar é um segmento im¬portante no desenvolvimento do país, visto que é a responsável pela maior parte da produção que abastece o mercado interno brasileiro. Cerca de 70% dos alimentos consumidos pela população vem da agricultura familiar. Dados do Ministério do De¬sen¬volvimento Agrário (MDA) apontam que o ramo representa 10% do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil.
Dessa forma, esses pequenos produtores são considerados os dirigentes do processo produtivo brasileiro. E em um Estado como Goiás, onde a agropecuária é o carro-chefe da economia – setor que cresceu 5,5% em 2012 – a ênfase dada ao pequeno agricultor é ainda maior. Pesquisa da Universidade Federal de Goiás (UFG) aponta que no Estado há aproximadamente 88 mil agricultores familiares, dos quais mais de 80% são de produtores tradicionais, isto é, que detém o título da terra em que vivem. Enquanto isso, a quantidade de terras ocupadas pela agricultura empresarial representa menos de 50 mil propriedades em Goiás.
Por isso, será realizada na UFG, entre 12 e 15 de junho, a Feira Agro Centro-Oeste Fami¬liar como forma de dar espaço aos agricultores do Estado para apresentar suas produções. A Feira é uma produção do Serviço de Apoio às Pequenas e Médias Empresas de Goiás (Sebrae Goiás), em parceria com a UFG e várias outras instituições. O evento será voltado para a discussão das diversas questões que en¬vol¬vem a agricultura familiar, como o acesso ao crédito e às po¬líticas públicas de incentivo à produção. Mas a intenção principal é expor os artigos produzidos pelos agricultores familiares, como artesanatos, compotas, pimentas, polpas de frutas, polvilhos, pescados, hortaliças e orgânicos.
Professor da UFG e coordenador do evento, Gabriel Medina explica que além da exposição, os produtos também poderão ser adquiridos diretamente dos produtores. “O evento visa expor aquilo que é produzido no Centro-Oeste. Nós temos várias feiras nos municípios, mas não tínhamos uma feira estadual em que o produtor pode mostrar seu produto para a sociedade. Mas ele não virá apenas mostrar e sim vender. E em paralelo a tudo isso, terremos um conjunto de cursos, seminários e programação cultural”, diz.
Fora os produtores goianos, a Feira contará também com agricultores de outros Estados. Em um dos 31 estandes da Feira, estará o Movi¬mento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) de São Paulo, que irão apresentar os produtos da região Sul do Brasil. “Nós teremos convidados. E o MST é um deles. Eles criaram em São Paulo um escritório para comercialização dos produtos do Sul do país, como arroz orgânico, queijo, salame, etc. e virão apresentar esses produtos. Fora eles, também teremos um grupo que vem de Ara¬gua¬ri, em Minas Gerais, que irá trazer vá¬rios produtos artesanais típicos de lá, como o berrante”, afirma Medina.
Mas a grande maioria dos produtores é de Goiás, principalmente de municípios como Iporá, Jataí, Piracanjuba, Itaberaí, São Luís dos Montes Belos, etc. E há produtores de Goiânia e região metropolitana. Caso dos produtores da Associação para o Desenvolvimento da Agricultura Orgânica de Goiás (Adao-GO), que estarão expondo seus produtos no evento. Fundada em 1999, a Adao é a primeira e única associação de produtores e consumidores de produtos orgânicos do Centro-Oeste, como explica Claudia Araújo Moreira, uma das coordenadoras da associação.
“Nossas ações são voltadas para economia solidária, isto é, uma ligação direta entre os consumidores e os produtores. Sempre organizamos visitas de pessoas às propriedades dos associados, geralmente na re¬gião metropolitana de Goiânia. Isso é feito para verificar as técnicas de produção”, relata. A associação é formada por 12 produtores e 80 associados consumidores, que valorizam os produtos orgânicos, isto é, aqueles cultivados sem agrotóxicos ou fertilizantes químicos.
A associação, que promove uma “feirinha” – como é chamada por eles – toda semana na Rua 74, em Goiânia, vendendo alimentos como arroz, feijão, milho, farináceas, mandiocas e derivados, leite e frutas, é favorável à Agro Centro-Oeste. Se-gundo Claudia, a feira é uma vitrine. “Um evento assim nos auxilia no propósito de ajudar o desenvolvimento da tecnologia de produção orgânica. À medida que a Agro Centro-Oeste vai crescendo, nosso visibilidade aumenta.”
Dificuldades
Claudia Araújo Moreira ressalta, porém,que a agricultura familiar em Goiás tem dificuldades. Ela diz que atualmente existem mais políticas públicas voltadas para a agricultura familiar e para a agregação de tecnologia, mas é preciso concorrer com vários outros projetos, o que prejudica o trabalho do pequeno produtor. “O que chega para o produtor é muito pouco, porque o que pesa na balança governamental é a agricultura empresarial. Porém, é preciso observar que quem coloca comida na mesa da população não são os grandes empresários.”
O gerente Setorial de De¬sen¬volvimento Rural do Sebrae, Joel Rodrigues Rocha, concorda com o posicionamento da produtora. Segundo ele, a grande dificuldade dos pequenos agricultores está em conseguir recursos para implantar novas tecnologias e agregar valor em seus produtos. Assim, as propriedades que têm acesso mais fácil conseguem melhores resultados.
Entretanto, Rocha pontua que a falta de conhecimento e o não acesso à informação também são obstáculos. “É devido a essa falta de informação que são formadas as parcerias em termos de políticas públicas tanto por parte do governo quanto do setor privado, que formam sistemas de capacitação para chegar ao produtor.” De posse desse co¬nhecimento, o produtor tem mais facilidade para gerir sua propriedade, além de agregar valor aos produtos que já produz.
O fato é que existem muitas tecnologias que facilitam, elevam a produtividade e são até de baixo custo. Contudo, os pequenos agricultores têm dificuldade tanto no acesso à informação quanto na implantação dessas tecnologias em suas propriedades. Dessa forma, o gestor de projeto rural do Sebrae, Antônio Talone Neto, conclui que a maior dificuldade desses produtores está na falta de assistência técnica. “O maior gargalo do setor é a assistência técnica”, diz.
De acordo com ele, a falta de assistência não permite ao produtor instalar novas tecnologias em seu sistema de produção, logo, não há agregação de valor nos produtos ao que concorda o professor da UFG, Gabriel Medina. Ele ressalta que as dificuldades em assistência técnica, principalmente em relação a tecnologias prejudica a produção. “Temos pesquisa que apontam, por exemplo, que a irrigação, um sistema básico em Goiás, é aplicado por menos de 13% dos produtores familiares. Isso explica um pouco porque a grande criação de gado, pois sem irrigação fica difícil produzir na época de seca. Outro exemplo: correção e adubação do solo são utilizados por menos de 20%”, afirma o professor.
Medina diz que essa dificuldade é histórica. Segundo ele, a assistência técnica é um desafio da agricultura familiar desde a década de 1990, quando o então presidente Fernando Collor de Melo fechou a Empresa Brasileira de Assistên¬cia Técnica e Extensão Rural (Embrater). Assim, desde essa época, não há mais uma assistência técnica pública que funcione no campo. “Fizemos um levantamento nacional com outras sete universidades do país e percebemos que a assistência tem chegado a menos de 20% dos agricultores no Brasil inteiro. E isso contando as instituições públicas, privadas e outras. Se levarmos em consideração apenas a assistência pública teremos um número ainda menor.”
Desafios
As movimentações milionárias do agronegócio não atrapalham o pequeno agricultor? Para Medina, sim, embora não diretamente. Ele ressalta que o agricultor familiar produz para o mercado interno enquanto o agronegócio vai para exportação. “Então, disputa por mercado não tem, o problema é a disputa por terra. Em áreas de expansão como nas fronteiras estaduais, principalmente no Norte do país, existe uma disputa mais forte por terra e isso gera uma série de conflitos”, analisa.
Já para gestor do Sebrae, Antônio Talone, não há ligação direta entre os dois ramos da agricultura, uma vez que os dois setores não disputam mercado. “São mercados diferentes. O agronegócio visa o mercado de exportação tanto de soja, milho e cana na produção de combustível. Já o agricultor familiar produz para atender o mercado interno.” Assim, a suposta “rixa” entre os dois setores não representa um desafio, ao contrário de outros pontos.
Um desses pontos está na questão da diversificação. A produção da agricultura familiar goiana está muito concentrada no leite, o que não é bom, mas – como já foi dito – a falta de incentivo e assistência técnica prejudicam a produção. Dados da UFG mostram que aproximadamente 80% dos produtores goianos produzem leite e possuem uma renda anual de R$ 15 mil. Já aquelas produções mais diversificadas chegam a agregar valores de até R$ 60 mil.
A diversificação é importante para o consumidor, mas é ainda mais relevante para o produtor, se observadas as sazonalidades de alguns produtos, como aponta Talone. “A produção de hortaliças, por exemplo, é difícil na época de chuva. Sem contar que o preço sobe. Então, é preciso diversificar durante todo o ano, pois otimiza a utilização de sua propriedade.”
Porém, ele ressalta a falta de assistência técnica. “Para diversificar mais, os produtores precisariam de maior assistência técnica para dar apoio a eles. Leite, por exemplo, é um produto que demanda maior tecnologia e ajuste na questão financeira. Por que o mercado dita o preço. Por exemplo, o litro do leite custa 90 centavos e o produtor precisa fazer sua produção ficar abaixo desse preço”, exemplifica.
Para o professor Medina, a agricultura familiar é um setor que possui grande potencial e que pode crescer mais. Ele lembra que o Estado possui uma situação fundiária bem definida, o que permite ao produtor investir em sua terra. Além disso, as propriedades, geralmente, são de fácil acesso, pois estão próximas às estradas e dos centros urbanos. Entretanto, falta acesso aos incentivos e políticas públicas. “Essas políticas têm pouco mais de 20 anos, mas os dados mostram que elas têm baixa capilaridade, isto é, não chegam a todos os agricultores. Atingem menos de 15% desses produtores. Fora isso, apenas 21% dos agricultores têm acesso a crédito.”
Todavia, segundo o professor, essa acaba sendo uma situação normal, uma vez que o Brasil é um país de 500 anos, mas que começou a apoiar o pequeno agricultor há menos de 20 anos. “Além disso, a origem do pequeno agricultor brasileiro é diferente do pequeno agricultor na Europa, onde desde a Revo¬lução Francesa ele tem terra garantida, apoio do Estado e cooperativas fortes. No caso brasileiro, é a origem da exclusão. Eram pessoas que trabalhavam para os coronéis, lutaram por reforma agrária, ganharam uma terra e foram produzir. E eles não entendem muito bem as políticas.”
Rodadas de negócios
Como forma de contribuir para a divulgação e comercialização dos produtos dos pequenos agricultores, o Sebrae irá promover durante a programação da Agro Centro-Oeste as rodadas de negócios. Essas rodadas consistem em aproximar os empresários dos agricultores familiares para que eles conheçam a produção e estreitem relações que, após o evento, possam se tornar negócios rentáveis.
Como explica o presidente do Conselho Deliberativo do Sebrae Goiás, Marcelo Baiocchi Carneiro, várias grandes empresas já confirmaram presença na Feira. “Entre as empresas que confirmaram presença estão: Grupo Pão de Açúcar, que é uma empresa de caráter internacional, Tribo do Açaí, República da Saúde, Pousada Monjolo, Obelisque Restaurante, além das escolas estaduais, que irão conhecer a produção que poderá formar o cardápio das merendas escolares”, informa.
Baiocchi diz que o Sebrae tem trabalhado para aprimorar o evento, apoiando a agricultura familiar. “Lá, os empresários poderão ver os produtos expostos e ter contato tanto com produções orgânicas quanto com produtos já manufaturados como polpas de frutas e compotas. É um evento importante para os produtores familiares.”

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